ponte colorida, na queda
d'água partida
coube a mim dar a vida por encerrada
tanto mais cruel pelo tanto de lutas
por glórias aqui se lhe negando injustas
em tramas pelo estreito palco encenadas
fecham-se as cortinas, vai encarcerada
autora de finas rotinas, da arguta
compreensão da humanidade, e escuta
a indiferença da platéia ingrata
vai em silêncio mas nunca forçada
prenhe de idéias, voz amordaçada
ser canonizada por autoridades
e coube a mim este papel perverso
onde carrasco a eternizo em versos
a vida num sonho de posteridade
estou me lixando
para os espinhos às minhas costas
para sorrisos caninos nos calcanhares
para a sanha da pomba e do musgo
para a sombra que me desbota
estou me lixando
para as vociferações do vento
para a lamúria e lamento
da lama da chuva e dos elementos
estou me lixando
para as andanças e desventuras
as matanças e ternuras
do homem de barro e outras feras
por essa esfera de terra
estou me lixando
para o lixo acumulado
em córregos após a cheia
e impropérios tatuados
em pedestais de areia
estou me lixando
me descascando
limando e rimando
por puro prazer
de tudo e de todos
me despir
pássaro à mão
eis o bruto
já quase surdo
sorvendo canção
do grito mudo
da dura pena
do apertão