quinta-feira, 18 de abril de 2013

platéia




vida, lúdica vida
ora teatro, ora um jogo
onde tudo vale, tudo é engodo
importa vencer e domar a platéia
ganhar aplausos e marcar ponto
ninguém pergunta o porquê
para quê tanto drama e disputa
para agradar alguém que não se vê



quarta-feira, 17 de abril de 2013

a floresta

Já era tarde, hora sonolenta da despedida e da volta.  Pôs o pé na estrada entre promessas de retorno em breve e interpelações divinas por sua segurança.  Foi devagar, perdendo-se de vista com um último aceno na distância, acompanhado de nuvens alaranjadas e da mudez dos campos.

Pouco a pouco, as sombras caíam e os trinados de pássaros eram rarefeitos.  Suas pegadas eram as únicas pelo caminho batido.  Logo encontrou-se no limiar daquela tão temida travessia: uma muralha viva de verde escuro e troncos enrugados mais velhos que os mais velhos.  Parou ali contemplando as copas altas e deu alento à sua garganta com um gole d'água do cantil.  Entrou.

Conhecia a trilha como as linhas da própria mão e no entanto à mínima sombra, novo sobressalto.  Pequenos sons furtivos no mar de folhas ao solo eram motivo para precaução.  Seus próprios pés quase não se faziam ouvir.  Sabia ser alvo de olhares entre feixes de caules alinhados, mas se distraía de pensamentos malévolos recitando passagens favoritas do livro de mágicas.  Palavras de encanto fortes, capazes de afastar feras e secar mau olhado.  Prosseguia assim sua jornada por aquele labirinto de velhas sombras, seguro de si, mas atento aos arredores.

De repente, algo se moveu.  Não viu com clareza o que era, mas com o canto da vista percebeu algo grande a certa distância numa área menos encoberta.  Parou e esperou por algum contato.  Como não teve resposta, a curiosidade falou mais alto que o temor e se esgueirou em direção à clareira.  Ofegante, espiou por detrás de um tronco.

No meio da clareira, jazia uma estátua, rodeada por pilares ricamente entalhados.  A figura tinha o semblante voltado pra cima, de onde a claridão do fim da tarde banhava seu rosto.  Parecia sorrir.

Como nunca houvera percebido esse lugar antes?  Poderia ter estado tão atemorizado com a passagem que nunca dera mais que um breve olhar nos arredores?  Que outras belezas haveria ali não mencionadas no livro mágico?  E o que teria se movido que primeiro despertou sua atenção?

Em sua busca por respostas, não foi mais visto por quem morava fora da floresta...

o que que




quando morrem as palavras na garganta
não recebem funeral
nem ganham vida eterna



o circo prossegue o espetáculo
o palhaço-equilibrista-mágico sorri enigmático
em meio ao duplo mortal vira pombo e voa



ontem o sol sorria
hoje chove
amanhã não importa



nas ruas os passos mal se olham
pisam com convicção sobre velhas trilhas
e quando param e vislumbram a sua, está apagada



que dirá a janela ao pôr-do-sol?
não se despede, pois sabe de sua rotina
mas range e trinca o dente



e toda essa cerca em volta dos campos
não é senão uma tosse de gargante irritada
e as ovelhas conhecem atalhos pra se perder



declarei minha alma em meu imposto de renda
bem inalienável e imóvel
aguardo uma pequena devolução



café na chuva




o café, quente
tomado a um só trago
fez um belo estrago

e o dia, malemolente
acordou de mau humor
e tirou do céu a cor

prevejo, minha gente
chuvas e trovoadas
o que mais espero? nada



desconcerto




desconcertado
na afonia
o acerto