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queimada -
última raiz
solo cede
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como é sensível nossa insensa tez
ao menor toque, mesmo que não frio
dobra-se, encolhe e nu, ora arrepio
ora envergonho orar mais desta vez
nenhuma crença mais intensa fez
duma criança, jarro ora vazio
num vasto lago onde jorra um rio
sua vazão, corrindo densas leis
lago cresce e transborda, ora à porta
ora à janela, toda sua revolta
por preso estar à forma que o comporta
quando se fecham, tanto mais se volta
contra quem há desfeito de suas bordas:
chove que a todos cobre a insensa tez
desaba sobre mim a escuridão
e a noite como foice me degola
cadáver sem uma boca, logo agora
que berro, sem demora, morre então
os ecos em meu peito ao infinito
borbulham sufocados, tudo em vão
as sombras que sufocam quando grito
são surdas como as portas, que aflição!
silêncio tão completo me recobre
conforto não encontro nesse leito
foi feito de dejetos pouco nobres
um túmulo onde jaz a mim afeito
meu sonho, que de dia, se descobre
murmura mesmos ecos com efeito
you wanna be free?
so be free, my friend
free all caged birds
feed them all absurds
so they soar the sky
so high until blend
into cloud's white glee
flee, flee then, just flee
flee away from them
wings they beat, wings jerk
flying they aim turd
a shitstorm comes by
nothing goes as planned
when our thoughts fly free
nunca encontro palavras de conforto
quando cobra-me o mundo sua miséria
dou-lhe meio centavo em desacordo
oferece-me a face das mais sérias
a pujança que lhe devo tanto fere-a
que se deita e seu corpo, como morto
é enterrado - mas pulsa, pulsa artéria
e a meu corpo ora clama ser seu porto
dividido entre mim e todo o mundo
abarcando do céu ao horizonte
cumpro pena prescrita a quem mudo
um proscrito ao luar sorvendo aos montes
do silêncio do mar trago bem fundo
pago a dívida ao ouvir-lhe o que hoje conte
rude carranca, o tempo, ele mascara
linhas cruéis com dentes escrevera
na fina tez, pra muitos, a mais cara
da fome eterna exposta na caveira
triste essa história, embora verdadeira a
face de tudo um dia ele massacra
nada sacia o tempo e se atrevera a
todas mascar, profana seja ou sacra
máscaras de papel, cetim ou ferro
pouco protegem - rosto segue enfermo
rugas que expressam fim de obra mais rara
obra sem fim de autor não consagrado
ninguém o lê, eterno desagrado
rude carranca, o tempo, ele mascara
morrerei de inanição
tenho a boca bem cerrada
pois são serras, dentes são
e as palavras serram erradas
e as palavras encerradas
vão pro peito, onde perdura
dura pena, encarceradas
sem um leito ou leitura
sem um leito, na lei dura
do deserto soterrada
minha boca, bem sei, fura
terra e rio certo errada
.
faz tempo
linha a linha
dentro e fora
sua mais antiga
pois infinda
obra, que ora
definha, ora
a devora
faz tempo
que parte faço
num papel à parte
em meio à face
desse calhamaço
onde se alinha
hora a hora
a vida à arte
faz tempo
obra sem fim
sem começo
e sentido meço
sobre dobras
e rugas as runas
e se desdobra
a parte de mim
.
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tenho saudade dos meus sonhos
daqueles que, travestidos de rostos do passado
me levavam pela mão por caminhos que nunca andei
que nunca conheci porque sonhava
quem sonha não se lembra mesmo de nada
são vagos, insubstanciais
inconclusivos. como minhas memórias
de um passado que só sonhei
tenho saudade dos meus sonhos
pois quem sonha só sonha
e mais nada
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